Eu não durmo direito desde que mergulhei em The Cat Lady e me pego pensando sobre o jogo o tempo todo; no trabalho, quando saio com os amigos e até mesmo em sonhos. O jogo traz à tona todo o material necessário para pesadelos, ou seja, é um game perturbador.
The Cat Lady é o mais recente game de Remigiusz Michalski, Harvester Games e Screen 7. Michalski, que criou o pouco conhecido porém aclamado "Downfall", retorna com um jogo de aventura adulto que lida com assassinos em série, depressão e, finalmente, esperança.
O jogador assume o controle de Susan Ashworth - aka The Lady Cat, uma mulher solitária de 40 anos à beira do suicídio que batalha contra seus demônios interiores. Durante sua jornada, uma série de serial killers são revelados a ela pela misteriosa Queen of Maggots (algo como rainha dos vermes).
O jogo é um adventure point-and-click À moda antiga, estilo que fez um enorme sucesso na década de 90 e nunca morreu, embora esteja carente de bons exemplares como outrora. E The Cat Lady é um exemplar e tanto. Embora o adventure seja um estilo de jogo por vezes lento, quando é bem feito consegue envolver o jogador como poucos jogos o fazem.
A parte técnica do jogo ajuda muito nesse trabalho de imersão. O estilo de arte de The Lady Cat é muito original; é bizarro e simples, mas extremamente bonito. A violência é sutil, mas é jogada na sua cara quando é preciso. O jogo não conta com violência banal para causar impacto. A desenvolvedora Screen 7 usa a história e a música de formas dramáticas para criar uma sensação inquietante, o que faz de The Lady Cat um jogo bem inteligente.
Depois de jogar algumas horas, você vai estar totalmente imerso na história. Pode ser um jogo confuso em algumas partes, mas é uma experiência gratificante.
O jogo
The Cat Lady é dividido em capítulos; cada capítulo é como desenrolar um carretel emaranhado de arame farpado cheio de sangue. Você está constantemente querendo saber se está vivo ou morto e que a única maneira de descobrir o que está acontecendo é fazendo um trabalho de detetive. Quando você não está resolvendo quebra-cabeças, você está interagindo com alguns personagens realmente estranhos. Essas conversas irão moldar a história que é contada.
Você pode mentir ou tentar responder honestamente, de qualquer forma você tem que prestar atenção e memória aqui é fundamental. Capacidade de observação aguçada e pensar fora da caixa irão ajudá-lo com a maioria dos quebra-cabeças. Lembra muito o que era jogar os adventures antigamente, antes da internet e dos guias. Se você estivesse preso, ia continuar preso; você realmente tinha que deixar alguns enigmas maturando em seu cérebro um pouco para resolver determinadas situações.
A jogabilidade de The Cat Lady, como eu disse antes, é a de um adventure point-and-click padrão, mas curiosamente o jogo pode ser jogado sem mouse e apenas algumas teclas são usadas. Os controles meio diferentes para um jogo de aventura não atrapalham o andamento de The Cat Lady, na verdade até ajudam a nos deixar com mais medo.
O jogador controla Susan movendo-a da esquerda para a direita em uma tela 2D com as teclas de seta. A visão recebe um zoom muito mais perto do que na maioria dos jogos tradicionais de aventura e o resultado é uma maior proximidade com a loucura que se desdobra continuamente diante de seus olhos.
Pressionar a seta para cima perto de um hotspot oferece várias opções, tais como 'examine' e 'pick up' que podem ser selecionadas com um toque na tecla 'Return'. Pressionar a seta 'para baixo' permite ao jogador acessar o inventário de Susan. Demora um pouco para se acostumar, mas controlar Susan desta forma contribui diretamente para aumentar o fator medo do jogo.
O sistema de inventário é fácil de usar e os itens que você pode pegar estão sempre bem visíveis no cenário, brilhando. Uma vez que um item é adquirido ele aparecerá na parte inferior da sua tela em uma janela de inventário. Porém, a simplicidade para por aí, pois The Cat Lady é realmente um jogo muito inteligente, com puzzles sofisticados que vão desafiar a mais brilhante das mentes. Como você deve interagir com os itens que você adquire vai fazer você coçar a cabeça e forçá-lo a tomar abordagens estranhas.
A dublagem é muito bem feita; com o elenco - todo do Reino Unido - ajudando a tornar tudo mais negro e assustador. A música é arrepiante e define bem o tom do game. A combinação da dublagem do elenco e da música mostram bem que muito esforço e dedicação foram colocados no jogo.
Os gráficos são incrivelmente detalhados - a maioria em preto-e-branco, com respingos de cores psicodélicas e sangrentas. A animação travada dá ao jogo um impressão inquietante. O jogo se recusa a cair em uma rotina, você nunca está completamente certo do que vai acontecer a seguir.
A trilha sonora feita pelo irmão de Remigiusz, Michal Michalski, é tão impactante quanto os gráficos. A música de fundo é atmosférica, pontuada por gritos assustadores e pelo rangido de portas, tudo misturado com pump rock para criar uma paisagem sonora que combina sempre com o que está na tela.
Houve alguns contratempos com a taxa de quadros e som, mas foram pequenos bugs que nunca atrapalharam a experiência. No geral, o jogo é bem polido e comparável com jogos de ponta.
The Cat Lady não faz muito sentido no início (prepare-se para um spoiler leve): quando o jogo começa, o jogador assume o controle de Susan e passeia por ambientes que parecem reais. Mas não é bem assim... É logo revelado que Susan recentemente tentou se matar. Mas este lugar é o céu, o inferno, ou algo no meio? A Queen of Maggots não oferece respostas claras, mas ela tem uma proposta: matar cinco psicopatas conhecidos como 'The Parasites'. Para ajudar Susan, ela a amaldiçoa com a imortalidade, garantindo que não importa o quanto ela sofra, ela nunca pode realmente morrer. Começa assim então a história perturbada de The Lady Cat.
É, uma premissa corajosa e bem obscura. Você tem que se entregar a ela - qualquer leveza ou humor para ser encontrado são praticamente enterrados pelo desespero esmagador e o retorno de Susan para a terra dos vivos não pinta o mundo real como um lugar particularmente acolhedor. O estilo de arte e os ambientes decadentes refletem o estado perturbado da mente de Susan - da banalidade clínica de uma enfermaria de hospital suspeita até um apartamento sempre sombrio, onde a única companhia a ser encontrada é a de gatos de rua. Susan está envolta em depressão e sua tristeza transborda pelo jogo. É extremamente desconfortável, mas totalmente necessário e absolutamente imersivo.
Os Parasitas
Os Parasitas em si são aterrorizantes. Serial killers que se deliciam com a morte, eles se escondem bem à vista. A polícia não vai ajudar - em um raro momento de humor negro, Susan se esforça para convencer um policial ao telefone que ela foi raptada por dois canibais. O policial puxa seus registros médicos e simplesmente recomenda que ela entre em contato com seu médico imediatamente. O pior é que nem mesmo o jogador pode ser 100% de certeza de que Susan não está apenas ficando louca e essa é a beleza de todo o jogo.
Susan pode estar perdendo a sanidade, mas a turma que fez o jogo nunca perde - eles a transformam durante o game: de vítima ela passa a ser uma heroína. Você vai vibrar em como a caça se torna o caçador. Susan é literalmente invencível, mas a ameaça de perigo e morte nunca diminui. Fazer um jogo de aventura assustador já não é pouca coisa, mas The Cat Lady é um dos jogos de aventura mais inquietantes e assustadores de todos os tempos.
O Veredito
The Cat Lady é um jogo de aventura point'n click incrivelmente bem feito, com enigmas satisfatórios e um enredo bizarro e envolvente. No entanto, o jogo rapidamente ultrapassa estas características louváveis para se tornar algo bem mais memorável - é um jogo pertubador, mas ao mesmo tempo imersivo e bonito. A depressão não é um tema particularmente agradável e, para muitos, é melhor deixar no escuro. Remigiusz Michalski é designer de jogos de aventura autoral - ele mergulha o jogador na escuridão o tempo todo, mas tem a habilidade de permitir sempre um leve vislumbre de luz - e esperança. Jogue o jogo uma vez, faça suas escolhas e viva com elas. Embora existam pequenos probleminhas técnicos e controles esquisitos no início, este é um dos melhores jogos do ano passado, independentemente do gênero ou plataforma.
Eu gostei muito de jogar The Lady Cat, mas é tão bizarro e macabro que não dá pra recomendar para todo mundo. A viagem vai levá-lo por alguns caminhos sinistros, mas a experiência será como nenhuma outra. Eu me considero um sortudo por ter jogado e fico feliz em saber que existem pessoas por aí corajosas o suficiente para fazer jogos como este. Remigiusz Michalski fez quase uma obra-prima e caso você jogue ela ficará para sempre na sua mente.
Ahh, e o jogo também ainda conta com uma homenagem emocionante para os fãs do gênero das antigas, principalmente quem curtiu e jogou MANIAC MANSION... Em dado momento do jogo, se você realmente é fça de Manic Mansion e sabe tudo sobre o game, vai se surpreender com algo que é exibido lá pro meio do jogo...
E o final, também, principalmente a última tela, é igualmente emocionante e sensacional, dentro do contexto da história e de tudo o que o game fez o jogador passar. Altamente recomendado!
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